terça-feira, 2 de abril de 2013

Surfin' Bird

De repente, Califórnia. Ouvia esta música e sonhava com as ondas do Hawaii e quanto inspirava a vontade de andar sobre as águas. Ter momentos rascunhados de messias.


Ironicamente, meu gosto musical foi para o rock e isto não permitia misturar gostos e a afirmação de personalidade (ou a falta de...) tornava intolerante com o gostos dos que surfavam como The Beach Boys. Assim os poucos surfistas que conhecia a maioria era de surfistas calhordas ou os “posers” e, preconceitos à parte, assim a minha vontade de subir numa prancha foi adiada.

Conheci o Paul e numa conversa disse que iria me ajudar a surfar, só que ficou na promessa, pois por muito tempo seu joelho detonado proibiu de subir numa prancha. Mas foi de suma importância para realização do meu sonho. Emprestou-me sua prancha e deu dicas valiosas do que eu deveria almejar, treinar e aprimorar.

O básico foi que preciso saber chegar além da arrebentação, ou seja, praticar o que chamam de joelhinho. Prática que consiste em furar as ondas e remar em direção ao fundo em que reside a calmaria.

Fui ali com a vontade e o ímpeto ligados em 220 e ali iniciei minhas tentativas de tornar-me um surfista. Logo de início fiquei bem abatido por ser subjulgado totalmente pelas ondas. Engoli muita água salgada, ralei cotovelos e joelhos na areia e – exausto – fiquei refletindo enquanto tentava recuperar o fôlego.

A cabeça trabalhava contra e tentava convencer-me de que já basta. Só que o sonho era antigo demais para acabar assim. Juntei forças e depois de tentativas e muitos erros consegui pegar os movimentos e o próximo passo seria aprimorar o que até então tinha desenvolvido.

Não saberia precisar quanto tempo fiquei ali mas depois de muito tempo consegui chegar além da arrebentação. Mar calmo, quase como uma enorme piscina. Nenhuma espuma branca, nem projeto de onda pela frente.

Um singelo passo para meu aprendizado, só que me sentia um vitorioso. Quando viro a prancha para a praia para urrar a minha vitória, um gélido terror toma conta do meu ser. Estava muito longe da praia. As pessoas pareciam pontos perdidos na areia. A mente, mais uma vez, começa a trabalhar. A correnteza vai me levar para o alto mar, estou cansado demais para retornar, um tubarão vai me pegar.

Não precisava manter meu monólogo consigo mesmo em silêncio, gritei para minha mente frágil de que não tenho tempo para conjecturar e sim é hora de agir e é só o que me basta. Vou remar e remar, descansar quando pegar uma carona numa onda e tentar voltar a colocar os pés em terra firme.

Creio que foi muito mais rápido do que fora a ida, mas podem imaginar o quão eterno pareceu a busca por este objetivo. Ninguém pode imaginar a minha felicidade quando a espuma das ondas carregavam a areia revolvida do fundo. Sinal claro que estava conseguindo chegar na praia. Alívio mesmo só quando toquei com meus pés e senti a textura abrasiva. Vontade mesmo era de repetir o gesto que marcou as viagens de João Paulo II. Só que ali estavam entes queridos que estavam felizes pelo meu retorno e bravíssimos com a minha irresponsabilidade. Contive meus sentimentos e fiz cara de que tudo estava sob controle. Tudo dentro do “script”, nada acontecera de extraordinário...

Hoje, posso escrever sorrindo e achando graça do que poderia resultar aquele pequeno contra tempo. Ficou várias lições para o resto da minha vida, nem poderia ser diferente, pois foi uma experiência intensa.

Acho que a maioria das lições todos podem compartilhar e refletir, mesmo não sentindo na carne. Portanto a lição que eu destaco é o paradoxo que a vida sempre traz.

Para ser feliz é preciso ir em oposição, enfrentar as forças, trabalhar as oposições. Conseguir subjulgar as adversidades. Ao alcançar, não há tempo para apreciar a conquista, logo ali é preciso focar no objetivo maior e saber, agora, usar as “adversidades” a seu favor.

NOTA: sou prego e a vida acabou por não progredir a contento em cima de uma prancha.

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