quarta-feira, 29 de agosto de 2012

União.

Ansiedade que acelera minha pulsação, estou a repassar meus planos para esta tão sonhada e desejada noite. Confiro o endereço do restaurante, o cinema mais próximo e os filmes que estão passando, pensando, fantasiando na noite perfeita.

Olho um restaurante alternativo, uma danceteria, nada pode tirar o brilho e a magia. Motéis próximos ao local, por que não cogitaria. Espero o melhor, preparado para o pior, sempre foi o meu lema.

Tento acalmar lembrando que o pior já ficou para trás, que foi o temor da rejeição. Sem muito sucesso, afinal, o medo de colocar tudo a perder está presente. Quando ligar para confirmar, ser pontual ou um leve atraso. Passar uma boa impressão que não seja da carência patética e muito menos a desvalorização e pouco interesse. Agora são as ocupações que gritam dentro da minha mente e imaginação.

Experiências anteriores não servem como referência ou um alento. Sempre a angústia de “a melhor impressão” faz as mãos suarem que conduz a mais nervosismo. Em meio a tempestade da minha insegurança terei que parecer confiante, seguro, sorridente e o importantíssimo brilho no olhar.

As horas parecendo dias enquanto confiro todo o programa pela enésima vez e começo a não acreditar que o momento tão esperado finalmente está chegando. Banho, uma conferida nos indesejáveis pelos que teimam em brotar nos locais mais estranhos. Caso tenha sorte, quero que ela saiba que eu despendi tempo preparando-me para esta noite e que não foi simplesmente a troca da camisa e fui buscá-la.

Estou próximo do endereço passado e vou dar mais uns minutinhos, uns quinze a vinte e com a desculpa de ter tido alguma dificuldade de localizar o endereço novo parece-me perfeito. Posso ainda brincar com o fato e dizer que sou meio atrapalhado.

Aproximo do portão, informo nome e apartamento de quem pretendo um contato. Ele informa que ela está descendo. Coração dispara, a boca seca, e agora? Penso em limão?

Alguns bons minutos depois ela aparece se desculpando pela demora. Respondo que nem havia percebido. Aliás neste momento nada importa, ela está maravilhosa. Minha vaidade as alturas em ver alguém tão bela despender seu tempo a agradar este reles mortal, jamais será merecedor de tanto. Vou cumprimentá-la e o seu cheiro faz minha lucidez sumir por um momento e quase não resisto em tomá-la em meus braços, esquecer tudo que fora planejado e dar um beijo apaixonado.

Com muito esforço retomo o bom senso e somente elogio o cheiro gostoso de seu perfume e seguimos para o esperado jantar. Que custará caro, mas valerá a pena com a certeza de que ela gostará de saber a importância que dei a todos os detalhes, assim espero.

Pouca comida, afinal fome é a única coisa que eu não sinto nesta noite. Não quero também que ela fique com esta impressão de um glutão ogro ruminando algum alimento de textura mais densa. A conversa flui, falamos de tudo um pouco. Atualidades, o tempo, gostos, banalidades. Um esforço monumental para não deixar de escutá-la inebriado com seus contornos e nuances. Hipnotizado pela sua voz doce como a brisa da primavera.

Dado momento, acidentalmente, nossas pernas se tocam por debaixo da mesa. Um breve momento se instaura e ambos não abandonam o ato. O roçar maroto como aprovação. Sorrisos  em ambos e tomo a iniciativa de pegar em sua mão. Mais coloridos tomam o cenário, músicas das esferas e as borboletas do estômago parecem querer a liberdade com muita vontade. Mais um passo a caminho da felicidade, se há espaço para mais.

Aproveito e olho para o relógio e lembro do horário do cinema e teço elogios para o filme que na verdade, a esta altura do campeonato, pouco importa. Ela aceita com empolgação e seguimos para o próximo destino. Dentro do carro, crio o cenário e a atmosfera para o primeiro beijo. Para minha alegria incomensurável, ele se consuma. Meu Deus, tenho a certeza de que neste exato momento posso voar. Posso, não, eu estou voando. Um clique para fotografar na memória mais uma cena que relembrarei até o final de meus dias.

No cinema rola a continuação. Quem morre, quem ganha, qual a trama do vilão? Quem se importa? Como é difícil conciliar minhas emoções e a razão. Quero seguir somente meus instintos e saber que também devo seguir princípios e os anseios de julgamentos que devem passar pela cabeça dela. O equilíbrio tão complicado entre o que é aceito e minhas vontades para que a magia seja plena.

Totalmente oposto a espera, a sessão é muito breve. Sem saber nem do que se trata e se o fim foi o felizes para sempre, se é que o filme deveria ter um final feliz para satisfazer a plateia.

Apesar das expectativas serem atendidas, não houve menção ou sinal de que deveria propor um local reservado para que pudéssemos conversar com calma e nem ousaria para não estragar o que até aqui foi e está perfeito.

Pouca conversa se segue, só sorrisos, suspiros, um abraço em meu braço e o repouso de sua cabeça em meu ombro. Paradas em sinais seguidos com um breve beijo. Uma das poucas vezes que não lamento a má sorte de não pegar todos verdes.

Chego no seu apartamento e encosto bem o carro. Eis que ela faz uma observação que faz o desapontamento surgir em minha face. “Deixa assim que já vou descer”, frase destruidora que arrebata grande parte dos meus sonhos desta noite. Um último e longo beijo de despedida eu questiono, mais que isso, imploro. Ela fica envergonhada com o silencioso e ostensivo “voyer” que pode estar ali na cabine da portaria. Pois bem, parece que a noite vai terminar aqui e apego-me as boas lembranças que tive e o que pode esperar para o segundo encontro. Portanto, serei educado e paciente para não colocar tudo a perder.

Saímos do carro, conduzo-a até a porta para despedir e agradecer pela magnífica noite. Ela se abraça esfregando as mãos em seus ombros dizendo não ter reparado que estava tão frio nesta noite de verão, se esquentaria com uma coberta e talvez uma taça de vinho. Digo que concordo, apesar de minha mente teimar em sugerir que posso ser muito mais útil que ambos, mas fica claro que não devo ultrapassar a linha que ela estabeleceu para o nosso primeiro encontro.

Nesse momento ela faz uma observação de o quanto parece depressivo tomar vinho sozinha. Com um ar de espanto em meu olhar, ofereço me para que o cenário não seja este e ela convida-me para subir. Palavras que soam como harpas de querubins, como se a luz divina acabasse de iluminar esta pobre alma. Sorriso no rosto e pensamentos na velocidade da luz a seguir.

Como de costume, o clichê “não repare na bagunça” é dito por sua maravilhosa boca. Como se houvesse olhos para algo além dela. Ela pede para aguardar no sofá e já puxando-a pelo seu braço, peço que me acompanhe.

Suave, tenro e intenso beijo. Abraços e as mãos seguem como Marco Polo a caminho das Índias desbravando e descobrindo os limítrofes do que é permitido. Um dos melhores jogos feito a dois. Sabemos onde irá terminar mas a expectativa e o mistério ativa nossa paixão de uma forma sem igual. Mesmo que ela diga de forma clara que nada além do que já ocorrera acontecerá neste fim de noite.
Certo instante, após vários impedimentos das minhas milhares de tentativas de burlar o que fora combinado, percorro de seu ombro a suas costas. Vou descendo com a irresponsabilidade insana pelo interior de suas vestes sem nenhum sinal de desaprovação. Explodindo de alegria vislumbro o sinal verde da conquista da terra prometida.

As carícias e beijos vão seguindo e novas fronteiras são transpostas, trazendo a sensação de que a terra prometida pode ser alcançada antes do despertar da manhã. Assim segue a dança mais bela que se encena somente a dois e para mais ninguém. A coreografia onde segue o rito de união entre Marte e Vênus. Um dueto que flui como se os protagonistas treinassem a perfeição. A narrativa discorre enquanto precipita as vestes de nossos corpos para o chão.

Minha mão explora seu corpo bailando pelas curvas, incapaz de se contentar com tão sublimes sentimentos, necessito dirigir meus lábios a tocar sua pele. Sentir o gosto de suas formas. Aproximar-me de Canaã pelo seu eriçar em sinal de aprovação e satisfação. A chuva de vestes contínua compassada por pausas de minha contemplação da arte da criação. Doce arte da sedução brincando com o paradoxo do desejo da celestial união profana. Adiada ao máximo para nosso próprio sofrimento em prol do prazeroso deleite. A competição, o joguete dos amantes em levar o outro a entregar os pontos e implorar pela fusão plena de nossos corpos.

Ainda individualizados, colocamos a nos contorcer sem ceder, bravamente e não entregar por mais extasiante que esteja. A eletricidade infesta o ambiente, ilumina a nossa atmosfera de libido. Sussurros e murmúrios são os cânticos destes dois que não se entregam à vontade e manobras ensandecidas com o único objetivo de extrair a tão espera súplica de seu parceiro.

Vem o silêncio, imóveis, só os olhos se atrevem a desobedecer a ordem eloquente da quietude. Como se houvesse uma linguagem entre eles se conversam. O universo inteiro parece saber que chega ao fim o embate sedutor sem derrotados, como, pelos olhos, chegassem em comum acordo que o nosso momento enfim chegou. A decisão rogada por ambos pelo sorriso, a concordância de tornarmos um único ser volitando pelo estimulo palatável do insípido sacramentado pela junção de nossas vontades.

As ondas, o trigal embalado pela brisa, a obra de um tear, orquestrados pelo nosso prazer. Preenchidos de juras sem sentido, pois afinal o intelecto é nada relevante. Intercalando momentos de travessuras, perversidades, romantismo e muita sensualidade.

Nosso caminhar atinge a colina, o ápice de nossa busca tão deseja concluída. Flutuando nas nuvens formadas pelos nossos sentimentos, ficamos ali calados a acariciar. Mentes vazias, como se o Universo coubesse inteiro no interior daquelas quatro paredes. Ou seria o Universo inteiro fora delas?

Enfim, nada mais a ser dito, nada mais a ser executado, nada mais importa além dos fortes laços que nos uniram e tão vividos permanecem a nos envolver. Pura magia, doce poesia, imersos, nos encontramos.

Inspiro abruptamente e retenho. Quero dizer tanta coisa, expressar tudo o que sinto, agradecer por cada segundo deste dia. São tantas que me assusta.

O pavor toma conta e faz me conter. Imaginando o quanto possa ser assustador as minhas ideias e o receio de mal interpretado eu ser ou que elas possam quebrar a magia do nosso momento ímpar. Decido, por fim, tão somente sorrir com um simples exclamar de “foi muito bom”. Aliviado pela sua resposta sorridente de “para mim também”.

Exausto, feliz, a coloco entre meus braços, um beijo sela o nosso aconchego mútuo e singular. Com a certeza de que dormirei com os anjos, o, anjo, anja e com ela sonharei ansioso para assim que o dia clarear, despertar ao seu lado e com um beijo sorridente dizer o mais gostoso e sereno “bom dia”.
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Lembrarei, lerei mil vezes este conto ao som de The Gazette - Pledge.

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